quinta-feira, 30 de abril de 2009

Trilogia Burocracia - Trailer

Tédio!

--(Imagens de ação clipadas!)---

Revolta!

---(Imagens editadas rapidinho, com música frenética)---

Encheção de saco!
.
---(Imagens aceleram + fade)--
.
O Devezemquando Productions apresenta mais uma superprodução.

Um homem.... determinado a viver a vida com prazer.

Ele não contava.... com um inimigo inesperado!

--- (sobe-som de música de suspense)----

A burocracia do dia-a-dia!!!

Receita Federal!

Detran!

Operadores de Telemarketing!

Inimigos poderosos....

mas ele resolveu ir à forra!!!

---(grande barulho de explosão! + protagonista diz: "I´m back!")---

Em breve....

no Blog devezemvez.blogspot.com

terça-feira, 28 de abril de 2009

Sabores

É só impressão minha

ou quando mordemos uma melancia sem doce

o gosto é o mesmo de um pepino?

Quando ajudei Maria Lenk a calçar as sandálias

- André, hoje você vai lá buscar a Maria Lenk!

Funcionário recém-admitido não recusa tarefas. Na maioria das vezes, nem quer rejeitá-las. O que não quer dizer que não esteja nervoso com a empreitada.

A missão não era das mais difíceis. Buscar a Maria Lenk na casa dela, no Leblon, para fazer uma entrevista.

Maria Lenk já estava muito velhinha naquele ano, em 2004, embora tivesse saúde de aço. Aos 89 anos de idade, continuava nadando, no mínimo, 1500 metros todos os dias.

Nadando como quando era criança, no Rio Tietê, ainda limpo. Ou em 1932, em Los Angeles, quando se tornou a primeira mulher da América do Sul a competir em Olimpíadas.

Nadando como em 1936, nos Jogos de Berlim, que Hitler usou para provar ao mundo a superioridade da raça alemã... (mas o ditador se esqueceu de combinar com um certo negro americano chamado Jesse Owens; Atleta voador que colocou os branquelos no devido lugar).

Naquela edição das Olimpíadas, Lenk e a delegação brasileira viajaram para a Alemanha de navio. Na embarcação, havia um tanque de água com uma engenhoca que produzia marolas artificiais. Os atletas, Maria Lenk inclusive, davam braçadas contra as ondas para treinar e não perder a forma física.

Um lindo símbolo: nadavam sem sair do lugar, provando que a delícia de nadar está no ato em si, e não na ambição de se chegar a algum local.

No carro com motorista, fiquei sabendo, pelo celular, que as regras do meu compromisso eram um pouco diferentes do que eu imaginava:

Maria Lenk estava sozinha em casa.
Morava no terceiro andar.
E um detalhe importantíssimo: o prédio não tinha elevador.
As instruções eram claras. Eu deveria subir, pegá-la pelo braço, e ajudá-la a descer as escadas.

- Oi, tudo bem? Eu sou o André, vim buscar a Maria Lenk. Posso subir?

- Pode sim, disse o porteiro.

Passo a passo escada acima, lá estava eu em frente à porta dela.

Vi primeiro os olhos esverdeados. Abriu sorrindo, me deixando bem confortável.

- Pode entrar, meu filho. Ainda não acabei de me arrumar. Me espera aqui na sala.

Fui seguindo o corredor que levava aos sofás. Havia várias fotos nas paredes, retratos dela em várias idades, sempre de maiô ou sendo homenageada numa solenidade. Acho que tinham medalhinhas também, não me lembro bem.

O tempo todo, estava preocupada comigo: - Calma aí, não vou demorar nada. Vou só trocar essa roupa de ficar em casa por um vestido. Fica à vontade.

Eu estava bem à vontade. Mas não parava de imaginar como era, para uma mulher da idade dela, viver num prédio sem elevadores. Tudo bem, ela era atleta. Provavelmente tinha mais vitalidade do que eu, que levava vida de sedentário. Mas não era mole subir aquelas escadas todos os dias. E o risco de cair? Toda pessoa, ainda mais idosa, corre esse perigo.

Maria Lenk voltou arrumada. Mas tinha um probleminha.

- Meu filho, será que você pode me ajudar a abotoar essas sandálias? Eu não consigo, não alcanço, pra mim é difícil.

A docura da voz dela era uma porta de entrada enganosa para a escuridão de uma árdua tarefa.

Eu estava muito nervoso. Não levo o menor jeito para isso.

Não tenho coordenação motora para cuidar de gente. Não sei fazer massagem, tenho medo de segurar bebês de colo, fico em pânico de de ajudar a fechar o vestido da minha namorada.

Naquele momento, o desafio era forçar duas extremidades de couro de uma sandália a se encontrarem atrás do calcanhar de uma senhora de idade, e, por isso, com pele e ossos frágeis. E o pior: caso eu tivesse sucesso com o primeiro pé, ainda haveria um problema gêmeo à minha espera. Falta de confiança total!

-Está machucando?

- Não, filho. Pode apertar.

- Tem certeza? Tô tentando. Ai... não tô conseguindo! Acho que não fecha não.

- Fecha sim, filho. Pode fazer que não tá doendo não. Eu tentaria, mas realmente não consigo. Sempre meus filhos me ajudam, mas eles saíram.

- Então vamos lá! Argh... agora vai!

E foi. Um depois o outro. Parecia um obstáculo intransponível. Mas consegui abotoar as duas sandálias, com muito custo. Fiz tanta força que tive medo de tê-la ferido. Será que é preciso fazer tanta força mesmo? - me perguntei.

- Vamos?

- Vamos.

Saímos do apartamento e começamos a descer as escadas. Ali, me lembrei que havia a segunda parte da jornada. Maria Lenk se apoiou no meu ombro direito e fomos descendo pé ante pé, bem devagar.

Além de não ter habilidades de tato paternais, como descrevi antes, sempre fui tão estabanado que temi por aquela descida dos lances de escada, que não terminavam nunca.

Se houvesse como fazer cálculos matemáticos para esse tipo de coisa, constataríamos que a meiguice e a tranquilidade dela eram duas vezes maiores que minha insegurança e ansiedade. E olha que eu estava bastante aflito.

O destino quis que minhas duas tarefas fossem cumpridas sem traumas e com sucesso. A entrevista de Maria Lenk foi linda. Um privilégio ter tido a oportunidade de dividir aquele dia com ela, passando apuros domésticos e ouvindo suas histórias.

Na volta pra casa, precisei apenas colocá-la dentro do carro, agradecer e acenar. Havia alguém esperando por ela no prédio para ajudar no caminho de volta.

Ela foi se afastando e eu guardei comigo essa história até hoje. E, acredito, para sempre. Foi a primeira e última vez que a vi.

Maria Lenk, ousada, desbravadora! Paulistana que ousou nadar na época em que nenhum marido queria esposa atleta. Acreditava-se que esportistas não poderiam engravidar.

A maior nadadora da história do Brasil morreu no dia 16 de abril de 2007, com 92 anos.

Coincidentemente, no período entre nosso encontro e a data em que faleceu, entrei na natação, treinei muito e consegui realizar o que nunca imaginei: atravessar o mar de Copacabana a nado duas vezes. 4 quilômetros, mais de uma hora de braçadas.

Pra mim, um grande feito. Para Maria, provavelmente, algo que faria com a candura e a calma de um sorriso.

Tantos anos de uma bela vida lhe ensinaram a não temer as situações mais simples, nem as mais difíceis. Tinha a mesma serenidade para cruzar mares revoltos e para abotoar sandálias.

Eu ainda tinha muito o que aprender.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Vincent

Acho que se esse barbudo concorresse à presidência, destronaria o barbudo daqui.

O sem-orelha ganharia do outro, que não tem o dedo mindinho.

O barba ruiva derrotaria o barba grisalha.

Incrível como Van Gogh sempre acaba sendo o preferido da maioria nas enquetes!

Tomei como base as cinco pinturas mais importantes da humanidade, escolhidas pela revista Bravo!

Um Picasso, um Michelangelo, um Velazquez, um Da Vinci... ou melhor, um Da Vinci não! O Da Vinci! A Monalisa estava no páreo!

E, mais uma vez neste blog, a votação deu Van Gogh como campeão!

9 votos dos 19 foram para o pintor holandês.

Que magia tem essas cores? Que feitiço tem essas formas curvelíneas? Que poder exercem esses nacos grossos de tinta, essas pinceladas cavalares?

Que segredo esconde essa aparente falta de técnica ao pintar, capaz de demolir a perícia e a grandiosidade das obras renascentistas?

Que força revela esse estilo único, capaz de ser o número um na preferência das pessoas, mais dramático até que a tragédia exposta em Guernica, de Picasso?

Que potência misteriosa tem esses laranjas, azuis e vermelhos que berram?

Parabéns, Vincent!

Pela pequena amostra que frequenta o blog, estou prestes a concluir que tu és, de fato, o favorito da maioria do mundo ocidental!

Acreditarias tu, em vida, fracassado, pobre e louco, que terias tantos fãs?

Será que, na angústia de tuas depressões, nos porões da tua auto-estima, sabias que tuas cores tinham tanto carisma?

Comerciais

Não é engraçado?

Quando vemos TV, os intervalos comerciais são a maior chatice.

No entanto, aqueles programas sobre anúncios interessantes são muito divertidos.

Concluo o seguinte: A qualidade nos atrai.

Podemos pinçar bons comerciais na programação. Mas a maioria é boba, óbvia, desgastada.

Um que está passando muito ultimamente é o do cara apaixonado por balinhas azuis. Ele passa os primeiros 15 segundos comendo as tais balinhas em diferentes situações. De repente, acorda com o rosto todo azul. Dá um grito e vai para o hospital.

Pensando bem, é bem idiota. Mas eu dou risada quando vejo.

Achei uma boa sacada, mas nem lembro direito de que é a propaganda.
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(Que ironia: alguns comerciais são tão bons que não esquecemos deles! Mas... que produtos eles anunciam mesmo?)

Há, contudo, as idéias horríveis, as brincadeiras de mau-gosto, as tiradas sem-graça.

Na verdade, comecei este post exatamente para resmungar de dois anúncios que estão indo ao ar.

Um deles prima pela falta de sensibilidade.

O outro tenta vender um produto dificílimo de fazer marketing. Chega a ser até engraçado.
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SKY.

Alguém já viu o último comercial dessa empresa de TV por assinatura?

É mais ou menos o seguinte: um cara com o controle remoto na mão. Uma voz do além fica dizendo pra ele que ele pode tudo! Pode ver o jogo do time dele ao vivo, mas pode pausar, se quiser, para ir ao banheiro. Se tiver a fim, ele pode voltar o jogo para um lance anterior. Tudo ao alcance dos dedos.

E a voz insiste, botando pilha: - Sim, você pode tudo! Pode qualquer coisa! Pode até voar! Voa, amigo, voa!!

A cena final é o cara se jogando pela janela. E a voz, envergonhada, dando a entender que o cara exagerou.

Péssima piada. De péssimo gosto.
Quem será que achou engraçado brincar com coisa séria?

Quantas crianças já saltaram de andares altíssimos, influenciadas pelo super-homem? Quantas pessoas com problemas psiquiátricos, de fato, ouvem vozes que as persuadem a fazer coisas?

Em uma tacada só, 30 segundos tripudiaram de esquizofrênicos e podem ter instigado crianças a fazer besteira.

Admito, eu tenho uma tendência a ser politicamente correto demais.

Mas acho que, quando lidamos com os canhões dos meios de comunicação (como a televisão), todo cuidado é pouco.

A mensagem passada aos clientes é: - Se assinarem a SKY, não esqueçam de colocar redes nas janelas.
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O outro comercial é constrangedor.

É engraçado ver os personagens, na televisão, tentando vender um produto sem falar, objetivamente, a maior qualidade dele: Aliviar a prisão de ventre!

Me dá aflição assistir àquela mãe, aquele pai, aquela vovó que consome o iogurte 'Activia' dando voltas e voltas para tentar explicar como o alimento melhorou o trânsito intestinal deles.

-Você está incomodado? Está de mau-humor? Ah, eu também era assim. Aceitei o desafio Activia, e agora vivo muito mais feliz!

- Er, bem... (pergunto eu) Mas você estava de mau-humor por que? E quais são os resultados práticos do Desafio Activia? O que aconteceu com você?

Neste diálogo imaginário, vejo os personagens do comercial envergonhados.. e respondendo:

- Ué, eu estava de mau-humor porque... porque eu... eu não estava muito bem de... de estômago. Enfim! Mas o que importa é que agora estou mais feliz!

Em outras palavras, é um tabu imenso tratar objetivamente do assunto em questão. Não pega bem falar de escatologias na televisão. Não seria nem um pouco popular.

Por isso, os caras preferem fazer um comercial todo colorido, alto astral, pra cima! Um "cerca-lourenço" danado pra fugir do assunto!

Fazer propaganda é a difícil tarefa de criar ilusões.

Às vezes para o mal, como quando Hitler fazia lavagem cerebral no povo alemão.

Às vezes infeliz, como no sujeito que se joga pela janela tomado pela sensação onipotente de um controle remoto.

Às vezes patético, como as pessoas sorridentes tentando fazer o telespectador entender, nas entrelinhas, do que se trata o desafio Activia.

De todo modo, é um artifício poderoso.
Mesmo com bom humor, bom senso é fundamental.

sábado, 25 de abril de 2009

Congelado

Toc, toc, toc.

São as batidas da picareta numa pedra de gelo colossal.

Sibéria. Frio de menos 25 graus.

O explorador continua o esforço. Vai descascando aquele bloco congelado.

Aos poucos, vai aparecendo uma forma humana.

Mãos. Braços. Peito. Cabeça.

Sou eu. Paralisado. Entorpecido. Imóvel.

O trabalho incessante durante a semana e neste momento inclusive (em pleno fim-de-semana), me deixaram sem tempo para pensar e escrever.

Muito tempo perdido com contratempos.

Totalmente escravo da vida cotidiana das obrigações.

Idéias neutralizadas.

Mas quero voltar.

Assim que tiver tempo!
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Este post é só pra dar um sinal de vida.

E, claro, fazer uma graça.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Mané

Quando criança me lembro da delícia de driblar.

Era bem mais fácil. O corpo, leve, permitia. Era divertido dançar sobre a bola. A brincadeira no andar térreo do prédio era tão gostosa quanto viver a própria vida.

Na Copa de 94, descer para jogar futebol ao fim de cada jogo da seleção era complemento obrigatório. Como um teatro em dois atos, não existia um sem o outro. Não dá pra dizer se era mais prazeroso ver o Brasil jogar ou chutar bola logo depois.

Chutar a bola e prendê-la. Deslizar com a posse dela. Correr com ela colada aos pés. E não passar pra ninguém.

Cresci. E descobri.

No mundo dos adultos, não é assim.

Quando um jogador faz muita firula, é xingado. A torcida perde a paciência. Se irrita.

Mas no fundo, eu sei, é recalque.

Todos reconhecem o talento do ídolo, mas o crucificam exatamente por saborear a própria habilidade e não prestar tanta atenção à equipe.

No fundo, todos queriam ser livres para driblar. Driblar no campo e driblar na vida. Driblar sem ter que fazer gol. Driblar as atividades, os horários chatos, os deveres, o trabalho.

Todos gostariam de ter todo o tempo que a diversão merece, sem ter que submetê-lo aos mandamentos da vida diária.

Poder levar todo o tempo do mundo despertando de manhã (ou não tão de manhã assim). Escovar os dentes devagar, ler o jornal ou ligar o rádio.

Beber água da geladeira no gargalo. Ficar de bobeira o quanto for necessário, pela simples razão de poder existir, por alguns instantes, sem obrigações. Poder chutar os horários para escanteio.

Todo mundo, no fundo, queria driblar como Garrincha.

Hoje em dia, na pelada dos sábados, os berros são para que se chute mais a gol. Para que se passe mais a bola para o companheiro.

Ninguém pede para o cara dar um drible a mais. Para pedalar mais, firular. Para embaralhar as pernas com a bola parada. Ninguém.

Estamos acostumados demais a cobrar eficiência, a termos metas e objetivos cobrados de nós. Ninguém, nem chefes nem governo, nos exige, : - Seja feliz. Fique despreocupado. Viva sem estresse. Vá curtir seu tempo de vida!

Quando era criança, assiti ao filme "Garrincha, a alegria do Povo" e fiquei inspirado. Desci para a quadrinha e tentei imitar. Deus tivesse tido bondade infinita de me conceder um décimo do talento do Mané...

Só por míseros minutos, para que eu pudesse me divertir, livre, como nunca consegui.

Mané não pertencia a este mundo. Tinha a mente tosca, precária, primária. Tinha o ritmo de vida da roça, tinha a pureza dos interioranos. Tinha a escolaridade do brasileiro médio. E não tinha pretensão nenhuma de render todo esse tesouro para a neura da cidade grande.

Jogou três copas do mundo como se estivesse descalço nos campinhos de terra de Pau Grande, sua cidade natal. Driblou zagueiros suecos e se divertiu como se estivesse entre amigos.

Tinha traços pesados, rosto de índio. Seus antepassados eram nativos da floresta, acostumados a escapar do homem branco. A tribo de seus avós foi uma das que resistiram por mais tempo. Eram exímios dribladores.

O sorriso inocente nunca largou-lhe os lábios. Parecia bobo, tonto. E era visto assim mesmo. Como um ser incapaz de compreender a seriedade do mundo civilizado.

Feliz era Garrincha. Bobos somos nós, que não nos permitimos a liberdade de fintar, de flanar sem preocupação pela vida.
Quais são nossos objetos de desejo? Que coisas sem importância nos fazem felizes?

Será que sabemos? Ou já foram, há muito, sufocados pelo cotidiano?

Mané conhecia a sua fonte de alegria: a bola. E a conduzia para todos os lugares. Não deixava ninguém tomá-la de seu controle.

Não por acaso, os devotos do pragmatismo, como nós e todos os defensores fintados por ele, ficavam com cara de pateta quando ele desfilava. Aquele ponta-direita desmascarava nossas certezas burocráticas. Mostrava que não valiam nada.
O que vale mesmo é dançar.

O camisa sete tinha um ar infantil. O mesmo ar infantil que eu tinha, aos 12 anos, quando a bola e o campinho de futebol eram a realização de todos os meus anseios em vida.

Criança não se preocupa com objetivos. Criança não vê horizonte. Criança só pensa no hoje e a vida parece uma eternidade.

Adulto é que se preocupa. Adulto pensa na morte. Pensa no fim. E, por isso, perde tanto tempo com prazos, metas e cobranças. São muitos os afazeres a serem cumpridos antes de o fim chegar.

Adulto não dribla. Adulto só sabe chutar no gol.

Garrincha teve, sim, um fim trágico. Vítima de excessos que, quem sabe, não atropelariam outros mais sagazes, mais escaldados nessa vida realista e utilitária. Mas soube viver seus momentos de bola na plenitude. Soube fazê-los valer por eternidades instantâneas.

Para ele, a vida era um campo de futebol sem trave. Sem rede. Era só um grande espaço para bailar, fintar e se divertir.
.
Ó Pai, como eu queria brincar como Mané.
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Finalmente, estou lendo o livro "Estrela Solitária", de Ruy Castro, lançado há mais de uma década.

Um livro que não parece livro. É grosso mas não pesa. Tem muitas folhas, mas como se as páginas não tivessem números. Faz o tempo voar. Recomendo a todos os amigos.

E quem quiser aprender a viver como Garrincha, a primeira aula é grátis:

domingo, 19 de abril de 2009

Pensamento à distância

Alguns já sabem, outros não.

Estive na China duas vezes em 2008. Nas duas ocasiões somadas, foram dois meses no país.

Escrevi as frases abaixo enquanto estava lá.

Mais de um ano depois, resolvi dividir:
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Estar do outro lado do mundo é filosoficamente interessante:

É quase como conquistar a lua.
Onde mais posso ir? - pensa o astronauta.

Quando se chega tão longe no globo, o que resta a explorar?

Descobre-se, a olhos vistos, que o mundo é finito.

A China, para os brasileiros, é um símbolo do inatingível.

"Nem aqui nem na China"; dizemos.

Os povos antigos viam o mundo como algo sem fim, misterioso, a ser explorado por toda a eternidade.

Mas botar os pés na Ásia e perceber que, em muitos sentidos, ela se parece com o ocidente é colocar um ponto final no mundo.

É deparar-se com o limite da megalomania humana.

Sim, estamos presos no planeta terra.

Não há mais mistérios a descobrir.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

5 pinturas essenciais

1- Monalisa, de Da Vinci


2- Guernica, de Picasso



3- Noite Estrelada, de Van Gogh


4- A Criação do Homem (Capela Sistina), de Michelangelo


5- As meninas, de Velazquez

Estou meio atrasado, admito.

A revista Bravo! lançou, há 4 meses, uma edição com as 100 pinturas essenciais da humanidade, todas por ordem de importância.

E cravou que as 5 principais são essas daí.

A campeã foi a Monalisa... unanimidade.
Será?

Por que boa parte da humanidade chegou a essa conclusão? A de que um pequeno quadro de uma mulher posando é mais importante que uma gigantesca e espetacular pintura no teto de uma igreja, com traços grandiosos e expressão corporal comovente?

Por outro lado, aquele modesto quadrinho é, inegavelmente, mais influente que as figuras de Deus e o Homem quase se tocando com os dedos (composição que quase cobrou a visão de Michelangelo. Ele pintava em cima de uma escada e tinha gotas de tinta tóxica pingando nos olhos).

E como trazer para o jogo das comparações duas obras que, aparentemente, demonstram menos técnica que o traçado perfeito do Renascimento? Como comparar um Van Gogh e um Picasso à Monalisa e à Capela? Que critérios usar?

Noite Estrelada seduz pelas cores, Guernica pelo drama de guerra retratado no desespero das figuras.

E o quadro de Velazquez, talvez o mais cerebral deles? Escuro, sombrio e misterioso.

No fundo, fazer listas e eleger os melhores é meio papo-furado. Não leva a lugar nenhum.

Gosto é gosto e cada um tem o seu. Não há como "rankear" certas coisas.

Por outro lado, esse exercício de contrastes pode levar a boas discussões.

Em meio a prós e contras, abro mais uma enquete:

Dessas cinco, qual é a sua pintura favorita?
Vote ali em cima na página, à direita.

Vamos ver se importância tem a ver com preferência pessoal.
Em termos de influência, a Revista Bravo diz que é a Monalisa. Você concorda?
Você acha justo a Monalisa ser considerada essa Coca-cola toda?

Para responder, é só clicar aí embaixo, nos "comentários".

Quem quiser listar a ordem de importância, pode também. E quem acha que falta algum quadro nesse TOP 5, por favor se manifeste! (Pra mim, faltou "O Grito", de Munch)

Vou deixar essa enquete varar feriado adentro. Vamos ver que bicho vai dar.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

A, b, c e d

O qeu é mias iorptnatme?

Cnoútdeo ou frmoa?

Com tdoa creztea, ceoúntdo.

Msemo com a fmora ebmrahladaa, o cnteúodo pervlacee.

Às vzees, as ltears tneatm ipmeidr. Mas o sginfiacido slata aos ohlos do lieotr.
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O que nos ensinaram na escola é mentira!

Colocar letras na ordem certa não é fundamental para escrever.
Mesmo caóticas, elas não têm o poder de matar o sentido do que se quer dizer.

A prova de que disciplina, regras e organização são uma obsessão do homem civilizado, mas não são fundamentais.

Improviso, imprevistos e uma dose de irresponsabilidade também podem fazer as coisas funcionarem.

Aprendamos, pois: o acaso também é bem-vindo.

Cidadania no banheiro

"Você não pode usar esse banheiro aí não!"

A frase dita não foi pra mim. Na verdade, eu estava distraído demais do mundo exterior, pensando na correria do meu dia-a-dia. Ainda assim, pesquei a frase no ar e acordei da hipnose.

Deu tempo de olhar pra trás e ver um grupinho de três funcionários, uniformizados com o traje cinza-feio de uma empresa que faz a manutenção dos computadores corporativos.

Naquele momento, o autor da frase esperava enquanto o advertido dava meia-volta e saía do banheiro em que tinha ousado entrar. Seguiram viagem até o sanitário"correto".

O primeiro andar dessa empresa de jornalismo é assim:

no mesmo corredor gelado de paredes cinza e carpete azulado, há três portas de banheiro. Numa delas está escrito 'Apresentadores'.

Ok. Admito que os apresentadores de telejornais precisem, realmente, de um banheiro exclusivo. Podem estar prestes a entrar no ar, estressados. Podem precisar ter certeza de que o toilette está livre, já que não podem perder tempo. No reino dos absurdos, este não é o maior deles.

Na outra porta, está escrito 'Jornalismo'. Aquele é destinado às demais pessoas que trabalham ali: editores, cinegrafistas, produtores, etc.

E na última porta, não há nada escrito além do tradicional bonequinho 'menino' ou 'menina'.

O engano cometido pelo funcionário da firma de computadores, rapidamente corrigido pelo colega, foi entrar no banheiro do jornalismo e não no banheiro dos zé-ninguém.

(zé-ninguém com 'z' minúsculo mesmo)

"Você não pode usar esse banheiro aí não!"
.
Ouvi a frase e despertei do meu estado de indiferença (aquele que apresentamos diariamente). Todos vivemos infurnados nos nossos próprios problemas. Olhar para o lado e se preocupar com pessoas desconhecidas só serve quando é pra fazer fofoca.

Mas a frase, dita de forma tão seca e conformada, me fez acordar do estado catatônico, voltado para mim mesmo. Olhei para trás por alguns instantes e não consegui sentir nada, a não ser indignação.

Que cena triste. O funcionário resignado com sua condição de excluído, informando amigavelmente ao outro, distraído, sobre a proibição. Aquele banheiro não era para o bico de nenhum deles.

E não é por falta de espaço. Ambos os banheiros, do 'jornalismo' e dos 'outros', possuem cinco vasos sanitários e quatro pias. Qual é o problema, então?

Por que separar toilettes como se vivessemos num sistema de castas? Qual a mensagem que se quer passar com isso? Seriam por motivos, meramente, de organização? Não consigo imaginar justificativa plausível.

Se eu estiver me sentindo mal e a primeira porta que eu vir pela frente for a dos apresentadores, será que não posso entrar?

Mais do que a proibição em si, me incomoda a passividade das pessoas frente a tamanho absurdo. Muitos nem param pra pensar como aquilo é discriminatório. Como uma simples plaquinha de banheiro pode desqualificar tanto um ser humano.

- Você não é digno o suficiente para fazer suas necessidades aqui! - diz a placa, nas entrelinhas.

E assim o homem se organiza socialmente.

Fazendo diferença até mesmo onde todos são iguais.

É a faceta mais mesquinha da humanidade. Merece ser excretada ralo abaixo, privada adentro. Merece o botão da descarga.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Teto

A média de altura, entre os humanos, deve variar entre 1,50m a 1,75m.

Todos temos uma característica comum: vivemos nossas vidas sem olhar pra cima.

Ok, às vezes reparamos na lua cheia ou percebemos que o céu está bonito.

Mas nosso 'default' é mirar sempre reto, em frente. Como se um grande toldo acoplado a nossos crânios nos impedisse de prestar atenção no que paira sobre nossas cabeças.

Para provar minha tese, recorro à seguinte pergunta: Como é o teto do seu lugar de trabalho?

Como é o teto do restaurante que você mais gosta?

E do shopping que você frequenta?

Consegue fechar os olhos e imaginar seus detalhes? Aposto que não.

Já tenho essa teoria faz algum tempo. Toda vez que me lembro dela, olho para cima e percebo como é verdadeira.

No meu trabalho, por exemplo. Consigo descrever, com certa precisão, a disposição dos computadores, as cores das poltronas. Mas só fui perceber o teto outro dia. É escuro, tem algumas partes metálicas, é possível enxergar tubulações de ar condicionado.

Andei perguntando por aí a amigos e queridos. A verdade é que nunca ninguém confirmou minha tese com a veemência que eu gostaria. Para ser sincero, todos mostraram pouco entusiasmo. Concordaram com pouca ênfase. Desconfio que só para me fazer feliz.

Como, admito, sou teimoso pacas, quis trazer a questão para o blog. E talvez, quem sabe, encontrar a mesma indiferença que senti esbarrando por aí.
Basta afastar o queixo do peito o máximo possível para começar a perceber as pequenas manchas que existem lá no alto, as sujeiras, os relevos, as sombras e outras surpresas.

Quero acreditar, inclusive, que no decorrer deste texto, boa parte dos amigos interrompeu a leitura para experimentar este novo mundo.
E nessa aventura de descobertas, me lembro de uma brincadeira que me intrigava muito quando criança. Bem simples.

Apenas um objeto era necessário: espelho.

Instruções: coloque o espelho virado pra cima, na altura do umbigo, e ande pela casa olhando para ele.

Quando a previsibilidade do chão se transformava em teto misterioso, dava medo de dar um passo a mais.

Cada batente da porta, que separa um cômodo do outro, parecia um obstáculo no qual eu estava prestes a tropeçar. Alguns trechos da casa davam a sensação de serem precipícios.

Teto: um limite dentro de casa. Um limite ao ar livre também.

Essa metáfora do desconhecido se estende para outro teto, o mais impossível que conhecemos; o Espaço Sideral!

Como já disse em um post passado, o ser humano foi criado para ficar preso à terra. Só não cria raízes para não ser confundido com plantas. Já que não viemos ao mundo para voar em direção ao céu, por que devemos prestar atenção nele? Nossa vida é aqui. No chão. Olhando pra frente!

E da mesma forma que a humanidade aprendeu que a infinitude do céu é algo inalcançável, aprendeu também a não olhar para os tetos de concreto que conhecemos. Ou que julgamos conhecer.

Será que tem alguém aí que discorda? Que se acha um expert no ponto mais alto dos recintos fechados?

Fique à vontade, pode atirar pedras. Eu as jogarei também. Todo mundo tem teto de vidro.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Contando histórias

Você tem dois minutinhos?

Gostaria de propor um desafio breve para quem tem um pouco de paciência.

Uma reflexão que está a um clique de distância.

Convido você a olhar agora para o relógio. Pode ser esse aí da tela do computador mesmo. Em geral, fica embaixo, à direita.

Ao clicar no botão 'Play' desse videozinho, em dois minutos você, provavelmente, estará arrepiado.

Minha intenção não é divulgar mais um desses videos manjados da internet. Não quero ser aqueles chatos que dão notícia velha.

É muito provável que você seja uma das 42 milhões de pessoas que já assistiram a esse clipe no Youtube. Se não for, que bom: a experiência vai funcionar melhor em quem sente o impacto pela primeira vez.

Mas quem já viu também pode participar. É comovente mesmo repetido.

Meu propósito não é chocar, não é abalar de graça. Gostaria de refletir sobre quais são os elementos de linguagem que fazem este clipe tão poderoso.

Por força da profissão, vivo me perguntando isso. Quais são as fórmulas para conquistar um telespectador, um público de cinema ou internet, num produto audiovisual?

Como fazer isso jogando limpo, sendo ético e honesto, mas sem abandonar o lado emocionante e sedutor de uma boa história?

Na minha opinião, o trecho abaixo é um bom exemplo. Um bloco de um programa da TV inglesa, um show de calouros daqueles que podem trazer fama (ou ridicularizar) pessoas comuns.

Apresentação feita, convite no ar:

Olhe para o relógio. Clique no Play. Daqui a 2 minutos e meio, a gente conversa de novo.




Não sei o que vocês acharam, mas pra mim, trata-se de um momento arrebatador. Emocionante mesmo.

Claro, há um lado clichê. Há um lado piegas. Mas existem, também, elementos de identificação muito poderosos, com os quais qualquer ser humano se relaciona facilmente.

É um daqueles velhos roteiros que tocam cada um de nós. A história do sujeito fraco e desacreditado que se põe à prova num grande teste, e é capaz de vencer todas as previsões mais pessimistas a seu respeito.

Mas há muito mais que isso.

Vocês perceberam que quase não há descrição?

Há, apenas, 10 segundos de apresentação do personagem. Uma voz em OFF conta que o cara se chama Paul, trabalha numa loja de celulares e que o mundo do Showbizz parece distante para ele. Ponto final!

E isso não quer dizer que o roteirista não conheça sua história completa. Pelo contrário, sabe tudo a respeito do protagonista. Mas escolhe mostrar apenas um trecho da vida dele.

Quando contamos histórias, temos a ilusão de que é preciso expor muitos detalhes, contar fatos minuciosamente.

Um engano. Às vezes, um personagem que se apresenta é muito mais espontâneo, eficiente e carismático.

Pelas palavras e pela linguagem corporal, Paul se revelou. Voz hesitante, um rosto nada popstar, personalidade insegura. Confessou ter o desejo incontrolável de ser cantor, mas temia um obstáculo quase intransponível: pouquíssima autoconfiança.

Pronto! Com 36 segundos de clipe, já conhecemos o personagem e seu conflito. Já sabemos que está diante de um grande desafio. O close nas expressões faciais dos jurados denunciam o menosprezo deles. Estava criado o cenário para um grande fiasco.

E tudo isso, lembro mais uma vez, sem precisar de descrição. Apenas depoimentos sinceros de Paul; uma boa edição de imagens, colando, em sequência, os olhares cheios de desdém dos jurados com o rosto apreensivo do calouro. Edição que cria tensão.

E trilha musical! Se bem escolhida, a canção deixa de ser pano de fundo para dar força à história contada. A musiquinha do início caiu bem.

Aí, Paul abre a boca para cantar...

Mas antes, outro recurso importantíssimo: Pausa. Silêncio. Suspense!

Ele pede, com um inclinar de cabeça, para que a produtora aperte o play na música de fundo. Enquanto isso, mais olhares de desprezo dos jurados. As pausas, nestes tipos de edição, são fundamentais para antecipar o clímax.

E aí, o ápice! Contra aparências e preconceitos, Paul choca todos os presentes com uma voz possante e surpreendente. Canta com vigor emocionante!

Aos poucos, todos aplaudem. Closes nos rostos revelam o espanto de cada um.

No fim, o "clímax do clímax". Paul atinge um agudo tão sublime que tem a força física de fazer as pessoas se levantarem. Todos, de pé, aplaudem! Os jurados se rendem.

A canção de Paul é o principal elemento que faz aflorar as sensibilidades. A música bem usada faz brotar arrepios.

Os aplausos e assovios do público presente são mais um ingrediente dessa química. A experiência coletiva de se emocionar, a catarse conhecida desde o teatro da Grécia Antiga, também fazem este vídeo funcionar tão bem!

Num piscar de olhos, 2 minutos e meio se passaram. Em 2:30, já nos envolvemos com uma história que tem início, meio e fim. Tão pouco tempo, mas tantos recursos para fazer a mensagem viajar com tamanha eficiência.

Contar histórias é fascinante. Seduz o homem desde os primórdios. Quando a humanidade não sabia escrever, a palavra oral era sagrada. Ninguém podia mentir, sob o risco de colocar toda a história e a cultura de um povo, passados de geração em geração, em risco.

Desde sempre, o homem gosta de narrar acontecimentos. Para fazê-lo com perfeição, não basta ter um bom personagem e um bom conflito. As "peças" complementares podem fazer toda a diferença.

domingo, 12 de abril de 2009

Tudo é sirene


Barulho.

Celular quando recebe mensagem.

Luzinhas de garagem quando um carro está prestes a sair

Buzinas de carro.

Bip-bip de Nextel.

Apito de guarda municipal

Microondas quando a comida está pronta.

Sirene de polícia ou de ambulância.

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Obedecemos sinais.

Através de um sons bruscos, agudos, longos, incômodos.

Os ruídos que nos chamam à atencão, no dia-a-dia, são golpes de desprazer auditivo.

Será que nunca pensaram em fazer um microondas com aquela voz doce de locutora de aeroporto, que dissesse "Ouçam todos! A comida está pronta"?
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Ou luzinhas de garagem que tocassem música divertida para avisar que vem um bólido saindo: "Meu carro é vermelho! Não uso espelho pra me pentear!"

Ou sirenes que pedissem, gentilmente"Amigos, com licença, emergência! temos que passar!"

Por que os sinais sonoros de alerta urbano são tão inimigos dos ouvidos?
Pense bem.
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Se temos certeza de que o homem é o unico ser capaz de processar informações verbais e compreender palavras à perfeição, por que utilizamos ruídos que poderiam chamar atençao de qualquer animal irracional?

No papel, a humanidade planeja uma ordem urbana civilizada, evoluída, com regras por escrito.

Na prática, os homens se adestram como cães.

Com barulhos imperativos e alertas estridentes.

A prova sonora de como o ser humano sabe que não evoluiu tanto quanto faz parecer.

- Senta! Deita! Pega a bolinha! Pega a comida no microondas! Olha o carro saindo! Abra espaço para a ambulância! Olha o celular tocando!

sábado, 11 de abril de 2009

Vencedor da Enquete: Internet

Quem diria!

A viagem do homem ao espaço não recebeu um mísero voto do total de 22 da nossa enquete!

O planeta Terra é chamado de mãe, que abriga com carinho todos os seres vivos.

Mas também pode ser visto como uma prisão. O ser humano não foi programado para existir em lugar algum fora do Globo Terrestre! Quando olhavam para a lua e para as estrelas, os homens pré-históricos urravam de admiração, mas certamente nunca imaginariam ser capazes de, um dia, viajar para bem perto delas.

Pois o homo-sapiens conseguiu. Lançou foguetes, ônibus espaciais tripulados. Viu a Terra de longe, descobriu que ela era azul. Vestiu jaquetas brancas especiais e capacetes, encarou o altíssimo risco de morte para embarcar num veículo espacial... e superou, talvez, o maior dos limites impostos à humanidade: a maldição (ou benção) de viver presa, eternamente, ao Planeta.

Que ironia. Tanto esforço e nem os próprios humanos reconhecem nesta façanha o maior dos seus espelhos. Nem a mais hercúlea das proezas fez com que os eleitores do blog (eu incluso) a escolhessem como a mais reveladora da nossa raça!
Como somos contraditórios, paradoxais, nós, os humanos! Mesmo sendo capazes de flutuar entre as estrelas, nós nos enxergamos, de fato, em criações bem mais mundanas!
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A capacidade de se autodestruir foi escolhida por 5 de 22 votantes como a mais característica da raça humana, simbolizada pela bomba atômica.

A 9a Sinfonia de Beethoven teve um votinho a mais. 6 em 22 elegeram a obra musical. Talvez, chancelando o fato de o homem ser o único ser artístico entre todos os habitantes da Terra.

Mas numa votação apertada, a internet foi eleita como a criação que melhor representa o ser humano. 7 pessoas visitaram o blog e clicaram na opção.

Coincidência ou não, a internet é a mais recente de todas as invenções que estavam no cardápio. Seria um indício de que nós, humanos, tendemos a valorizar mais o que está na ponta da tecnologia? Será que, daqui a 100 anos, votaríamos em algo que tivesse sido recém-inventado?

Será que, no fundo, somos seres tecnológicos, acima de todas as outras características?

Muito obrigado a todos que participaram e se divertiram com mais essa enquete! Obrigado pelos cliques e pelos comentários também. Valeu, também, Valmir e Remi, que estenderam a discussão para seus blogs!

Reproduzo, abaixo, o que já tinha escrito em um dos comentários. Conto qual foi meu voto e a justificativa. Abração a todos!
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A verdade é que, em cada uma dessas invenções, está um pouco da essência da humanidade.

Porém, meu voto foi para a Nona Sinfonia de Beethoven: Acima de todas as capacidades do homem, me arrebata perceber que o ser humano é um ser artístico.

Capaz de produzir obras musicais, gráficas ou literárias, que não têm impacto algum no meio-ambiente. Na prática, nem precisavam existir!

Não cruzam a estratosfera terrestre como os foguetes, não invadem terra adentro como a muralha, não são tecnológicas como a internet e não destróem como a bomba atômica!

Porém, obras artísticas só existem, exatamente, por terem um alvo apenas : O ser humano. E nele, provocam imenso impacto.

Na minha opinião, nada mais humano que a Arte. E poucas obras de arte são tão poderosas como a Nona de Beethoven.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Conto inspirado em fatos reais

"Canhoto gosta do mouse do lado esquerdo! É tão difícil entender isso???"

Um grito sem voz nascia das entranhas de Carlos e morria na garganta, bem antes de se propagar. Claro, não pegaria nada bem sair berrando no ambiente de trabalho. Mas que dava vontade, dava!

Toda vez que o jornalista chegava para trabalhar, encontrava o mouse do lado direito. Dava início, então, a um ritual diário, que já durava uns dois meses.

Puxava a cadeira com rodinhas na sua direção, sentava-se confortavelmente. Passava o mousepad para o lado esquerdo e trazia o mouse na sequência. Puxava o monitor do computador para frente e colocava o bonequinho que enfeitava a escrivaninha um pouco atrás da tela do PC. A ordem daquelas etapas nunca era quebrada, como se existisse um manual passo-a-passo.

A primeira vez que realizou a sequência de movimentos, não deu a devida importância. Mexeu na configuração da mesa com a inocência de uma criança que brinca na areia. Mas não demorou muito para a sucessão de gestos ganhar contornos de uma guerra silenciosa.

Naquele mesmo computador trabalhava outra pessoa, mas no turno da noite. A cada manhã, Carlos percebia que a disposição dos objetos tinha sido modificada. Sempre à mesma maneira: mouse do lado direito, mousepad idem. O monitor do PC um pouco mais pra trás e o bonequinho colocado, cuidadosamente, à frente da tela, bem perto do usuário.

Ele não deixava barato. As preliminares do trabalho, religiosamente, seguiam aquela liturgia: toda manhã, antes de qualquer ação, os objetos dançavam conforme seu próprio gosto.

O jogo se prolongou durante muito tempo. Como um tabuleiro de xadrez que só tem duas casas. Um jogador arrastava a peça pra lá, o outro a trazia pra cá.

Depois de alguns meses, não era mais possível desisitir. Se abrisse mão de um de seus movimentos, seria interpretado como um fracassado pelo funcionário da noite. Ele não estava disposto a isso. Não queria dar a entender que não era senhor daquele espaço. Pagava pra ver a hora em que o rival da noite iria desistir.

Carlos conjecturava. Quem seria o competidor? Seu palpite era de que tratava-se de uma mulher. Aquele bonequinho, imaginava ele, pertencia a um dos filhos pequenos dela. Na lata de lixo que amanhecia aos pés da cadeira, sempre havia lenços de papel dobrados e embalagens de chiclete. Homem não dobra lenço, homem amassa! E esse chiclete aí de melancia tem a maior cara de ser coisa de menina. Mas que tormento! Tudo não passava de especulação.

Um dia, ficou trabalhando até mais tarde. Mas não tarde o suficiente para encontrar-se com a adversária, pensou ele. A cada minuto, na verdade, Carlos ficava angustiado. Queria acabar logo e ir embora. Por algum motivo, não queria descobrir a identidade secreta da rival. Tímido, não suportaria o constrangimento. - Mas que besteira!, imaginava, para se convencer de que estava transformando aquilo num bicho de sete cabeças.

Por via das dúvidas, desligou o computador sem acabar de fazer o que tinha que fazer. Levantou rapidamente e foi saindo da redação. Cruzou com uma mulher de uns 30 anos, morena e magra. Nunca a tinha visto antes. Será que era ela? Cumprimentou-a com educação e continuou andando. Não olhou para trás.

Uma manhã, percebeu algo estranhíssimo conforme se aproximava do computador. O mouse continuava do lado esquerdo! O que teria acontecido? Seria a rendição confessa de sua inimiga? Naquele dia, foi até difícil abrir os trabalhos. Não havia o que arrumar na mesa. Era como se algo estivesse fora do lugar, como se tivesse sumido parte importante da sua rotina.

Dia após dia, o mouse continuou dormindo do lado esquerdo. Mas na sexta-feira da segunda semana, Carlos se tranquilizou. - É lógico! Ela entrou de férias!!!

Ufa. Um alívio! Contou mais 15 dias e pronto. Lá estava o mouse do lado direito novamente. O desafio havia recomeçado.

Cinco semanas depois, Carlos recebeu a melhor notícia da sua vida profissional. Seria promovido! Virou chefe! Não mais trabalharia ali!
Almoço com os amigos, tapinhas nas costas, champagne, jantar caro com a esposa, muita comemoração. E o melhor. Teria uma sala e um computador só para ele!
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Antes de deixar aquela escrivaninha pela última vez, desligou o monitor devagar. Esperou calmamente até que o computador apagasse. Afastou a cadeira para trás, levantou-se. Deu uma leve ajeitada no mouse que já estava à esquerda, seu lado favorito.
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Botou a mochila nas costas e hesitou um pouco antes de sair. Sabia que, após o movimento noturno, nunca mais teria direito à réplica. Baixou a cabeça e admitiu, baixinho:

- Xeque-mate! Você venceu.

Jurassic Blog

Um fim-de-semana de trabalho incessante
+
Internet dando problema durante a noite
+
falta de idéias para escrever
+
não responder os leitores que comentam

=

JURASSIC BLOG!!!

Um blog parado no tempo!!!

Mas não desistam! Em breve, se tudo der certo, a evolução diária continua...

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Quem somos nós?

Criador e criatura.

Quantas invenções são espelho do inventor?

A criação pode refletir a personalidade do indivíduo. A imaginação. A obstinação. A genialidade dele.

E pensando na humanidade como um todo, qual destas obras melhor representa o ser humano?
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Na sua opinião, qual delas mais simboliza a nossa raça?
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- o ônibus espacial? (E a conquista dos limites impossíveis)
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- a Muralha da China? (E o desejo megalomaníaco de resistir, gigantesco, por toda a eternidade)

- a internet? (A capacidade de unir os humanos através da tecnologia)

- a 9a sinfonia de Beethoven? (talvez a mais comovente criação artística existente)

((ouvir o clipe a partir do minuto 3:23))

- a bomba atômica? (a capacidade de aniquilar tudo, inclusive a si próprio)


E aí?

O Homem é, antes de tudo, um conquistador? Um megalomaníaco? Um ser tecnológico carente? Um artista? Ou um destruidor?

Vou lançar esta enquete ali, no alto à direita. Por favor, votem na opinião de vocês.
Os cliques podem ser dados até sexta-feira.
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Quem somos nós?

quinta-feira, 2 de abril de 2009

A alma do negócio



Propaganda de uma grande liquidação de brinquedos na Austrália.

Com gente de verdade.
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Quando se mexiam, parecia que as mãos gigantes estavam brincando com eles.

Invasão bárbara

Um asilo de velhinhos é um lugar triste.

Pessoas no fim da vida, que por uma razão ou por outra foram relegadas à reclusão.

Há quem cuide deles, é verdade. Mas há carinho?

Alguns, doentes, já saíram do ar. Não participam mais disso que chamamos de realidade.

Outros, lúcidos, estão lá por outros motivos. São um peso para a família. Não têm mais condições físicas para viver sem assistência. Não têm entes queridos. São sozinhos.

Na época de escola, fizemos uma excursão a uma casa de idosos. Levamos lembrancinhas, presentinhos baratinhos mesmo. Mas nossa passagem por lá teve uma importância inestimável. Jóias e ouro não valeriam tanto quanto nossas horas de carinho dedicadas a eles naquela tarde.

Em comum, os idosos têm, todos, um ar inocente. Não importa o que tenham feito durante a vida. Na flacidez dos corpos e nos cabelos brancos está uma ingenuidade só percebida em crianças. Incapazes, mesmo que quisessem, de fazer mal a alguém.

Foi aí que um filho da puta, armado com pistolas e um fuzil, meteu o pé na porta e abriu fogo.
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EUA, uma cidadezinha na Carolina do Norte, dia 29 de março de 2009.

Robert Stewart, de 45 anos, fuzilou doze pessoas numa clínica para idosos. 7 pacientes e um funcionário morreram. Quatro continuavam feridos no hospital. Os velhinhos tinham entre 78 e 98 anos. Ao contrário dos outros crimes covardes ocorridos nos EUA, Robert não se suicidou. Trocou tiros com a polícia, ficou ferido e foi preso.

Fazer esta pergunta é tão óbvio quanto recorrente, cada vez que acontece uma tragédia dessas: o que leva uma pessoa a tamanha crueldade?

Como nenhuma justificativa explicaria algo tão escabroso, talvez interpretar o ato em si nos dê mais pistas sobre os motivos psicológicos do assassino.

Metralhar uma escola de crianças ou uma casa de velhinhos é um símbolo de poder absoluto. Não há a mínima chance de reação. É um cabo de guerra injusto, onde só um dos lados pode vencer.

Além de tudo, é um crime sem honra. Não há mérito algum em tamanha carnificina. Bem diferente, por exemplo, dos duelos dos filmes de Bang Bang, onde cada rival tinha 50% de chance de vencer.

Por que esse tipo de homicídio é tão comum em países ricos? O que seduz tanto em chacinar pessoas indefesas e sem propósito claro?

Não tenho a pretensão de elucidar o mistério, mas podemos riscar a superfície.

Na cultura dos "vencedores", quem não vence não é nada.

Não há indivíduos com defeitos e virtudes. Só existem olhos para os tais 'Vencedores', cujas imperfeições ficam mascaradas por trás das glórias.

E há os que não conseguem alcançar os padrões de "vitória" concebidos pela sociedade.

Aos vencedores, é dado o direito de tripudiar dos perdedores. Por que será que as escolas americanas têm a cultura do "bullying" tão forte? (os mais fortes abusando dos mais fracos).

Em meio aos poucos 'winners' estão os muitos 'losers'.

Para a mistura que acaba em tragédia, faltam alguns ingredientes. A população da maior parte dos EUA (excluindo algumas metrópoles) é autocentrada e orgulhosa da própria ignorância. Não conhecem o mundo, não têm cultura geral, e se bastam no único estilo de vida que conhecem, o 'american way of life' medíocre e angustiante.

O americano médio se afirma tanto na própria cultura que acaba se afogando nas águas rasas e toscas da própria vida. Chega uma hora que não aguenta mais um horizonte tão manjado, um cotidiano tão atormentado e previsível.

Junte-se a isso uma incrível facilidade para adquirir armas. Um povo que se orgulha delas, que atravessou os séculos guerreando. O assassino dos idosos, aliás, era um caçador de veados. E, pasmem, uma das propostas levantadas para solucionar incidentes como este foi armar os enfermeiros!

Ignorância, frustração e pólvora se transformam em crimes inexplicáveis.

Há séculos, os EUA incutem em seu povo que o estilo de vida americano beira à perfeição. Os ideais fundadores da pátria são perfeitos. O sistema de governo democrático é perfeito. Os ideais puritanos que construíram a nação são perfeitos.

Fico imaginando como é a sensação quando cai a ficha. Quando o americano médio percebe que, ao contrário de tudo o que sempre aprendeu, sua vida não é perfeita. Pelo contrário, o vício de mergulhar no próprio umbigo é profundamente frustrante e alienador.

Talvez venha daí este ímpeto diabólico de sair atirando em velhinhos.

Qual o sabor de disparar contra uma senhora de 90 anos numa cadeira de rodas?

Seria um ato simbólico, de matar tudo o que fosse caquético e ultrapassado como a sua própria cultura?

Seria o gesto derradeiro de um perdedor, sujeito imperceptível aos olhos de todos, mas que acabara de se tornar visível?

Seria o último sintoma de uma doença cultural que inventa ideais? Quando o cara descobre que verdades são ilusões, tudo se transforma num vazio tão grande que até o gesto mais perverso não tem gravidade ou sentido.

Os americanos deveriam abandonar a idéia de armar as possíveis vítimas, como inspetores de colégio, enfermeiros e garçons de lanchonete. E atacar o problema real: desarmar a própria arrogância.

A ilusão da perfeição esconde podres, e é muito mais perigosa do que admitir as próprias falhas e reconhecer que há muito que evoluir.